Wolf Creek (2005) - Direção: Greg McLean





Wolf Creek – Viagem ao Inferno foi lançado há muito tempo no Brasil... Em fevereiro de 2006 para ser mais exata, durante minhas férias de verão do meu último semestre na faculdade. Assisti ao longa em uma sessão matutina do Cine Victória, antigo cinema de rua, localizado na Avenida Borges de Medeiros, no centro de Porto Alegre. Era um horário meio ingrato, 10:00 horas da manhã, mas a sala estava praticamente vazia. A única coisa que eu sabia sobre o filme é que se tratava de mais um longa do movimento chamado torture porn. Na época, eu já havia visto Cabana do Inferno, feito pelo Eli Roth, e Jogos Mortais, codirigido pelo Leigh Whannell e James Wan, e estava fascinada pelo subgênero. Também sabia que o filme era baseado em fatos reais. Mas, definitivamente, nada do que eu li anteriormente sobre a película poderia me preparar para o que eu vi naquela tela de cinema.


 



O filme, dirigido por Greg McLean, mostra a viagem de três mochileiros, interpretados por Cassandra Magrath, Kestie Morassi e Nathan Phillips. Duas jovens inglesas decidem encerrar seu mochilão pela Austrália com um tour de carro de três semanas, acompanhadas por seu amigo australiano. A primeira parada é o Parque Nacional de Wolf Creek, um local que realmente existe e é muito isolado. Logo que eles chegam nas cercanias do lugar, são recepcionados por cidadãos brutos, que assediam as jovens. Depois de passarem o dia todo na cratera, quando tentam sair de lá, o seu carro não funciona. Eles acabam sendo socorridos por um caçador de cangurus. Mick Taylor (John Jarratt) é um homem típico do deserto australiano e dono de uma risada macabra. Ele leva o trio até a sua casa para consertar o carro dos jovens, mas logo o homem benevolente acaba mostrando sua verdadeira face. 



Greg McLean conduz a película com maestria por um universo de terror totalmente possível. Nós não estamos falando de um vilão sobrenatural. Mick Taylor é um assassino torturador real. Poderia ser o seu vizinho. É o cidadão de bem da cidadezinha do interior, solicito durante o dia, mas capaz de coisas horríveis quando a noite cai. John Jarratt é simplesmente genial e conseguiu transformar esse assassino caipira australiano em um personagem muito macabro. Taylor é uma figura crível e original. No universo do horror, é muito fácil que o ator caia em clichês e redundâncias. Jarratt, porém, investiu em um perfil muito particular para esse assassino. Eu adoro a franquia Wolf Creek e, mesmo achando que o plot já está um pouco desgastado depois de dois filmes e duas temporadas de uma série televisiva, John consegue ainda acrescentar um tom obscuro para o serial killer a cada novo produto. É uma coisa que me impressiona muito. E me assusta na mesma medida, pois o Mick Taylor, como eu disse antes, ultrapassa as barreiras da ficção. Ele é um sujeito que poderia ser encontrado no outback australiano. É um Crocodilo Dundee das trevas. Quanto mais John fica confortável no papel, mais intenso e maquiavélico Mick se torna. E McLean percebe isso e dá vazão para isso no segundo filme e também nos episódios da série.



Além do vilão, outra coisa que me deixa impressionada nesse longa é a ambientação dele através da música. Mesmo que você comece a assisti-lo totalmente desavisado(a), sem ler a sinopse, você sabe que algo muito ruim vai acontecer em algum momento. Desde o começo, muito antes do horror se fazer presente na tela, nós presenciamos várias cenas felizes dos jovens entre amigos, se divertindo. Só que não são momentos genuínos para o espectador, pois o cineasta investe em uma trilha incidental melancólica que demonstra que estamos testemunhando os últimos momentos daquelas pessoas. É desolador.

O diretor não poupa ninguém em nenhum momento. Primeiramente, ele faz que você crie um laço de afeição com aqueles jovens, o que foge um pouco do que o cinema hollywoodiano costuma apresentar, onde todos os personagens são estereotipados e já dividimos quase que instantaneamente a nosso afeto no começo da película. Aqui, os três mochileiros são pessoas ótimas, divertidas. Não existe muita diferença entre eles. São pessoas comuns. E você não anseia, em nenhum momento, que eles sejam eliminados pelo assassino, o que acontece em algumas produções. Na realidade, você gostaria de protegê-los. Principalmente durante as cenas no acampamento de Taylor. Kestie Morassi, inclusive, protagoniza uma das melhores cenas do longa. Sua personagem, desolada, foge ensanguentada pela estrada vazia, no meio do nada, enquanto o assassino se aproxima. É algo muito impactante. Mclean quebrou o meu coração em mil pedaços naquela sequência de takes. São imagens que ficam ainda mais poderosas em uma tela de uma sala de cinema. Duvido que você também não tenha sentido vontade de invadir a ficção para ajudar aquela pobre menina como eu senti.


Greg é um dos grandes diretores dessa vertente de um horror mais real. Ele fez outros filmes incríveis, como The Belko Experiment. Na minha opinião, é o cineasta mais talentoso da safra do splatter da década de 2000-2010. 



Sobre Wolf Creek, trata-se de uma grande obra do terror, onde o cineasta não cede em nenhum momento. O terror oferecido flerta muito com a realidade e isso gera um sentimento agridoce ao espectador, o qual irá acompanhá-lo por muito tempo após os créditos descerem pela tela. Em eventos trágicos, como no caso do assassino em série Ivan Milat, o qual inspirou a história do longa-metragem, as vítimas não sobreviveram. E esse é o desconforto que McLean quer que você leve consigo. O horror também investe em finais felizes, em garotas sobreviventes que derrotam o monstro, na paz restaurada quando o inimigo é vencido. Mas na crueza do mundo, às vezes os seres monstruosos são mais fortes do que as vítimas. É sobre isso que essa película fala. Sobre a invencibilidade sazonal do mal.

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